Como foi passar para a perspectiva de diretor?Matheus: Sempre fui um ator muito colaborativo. Sinto-me menos um ser dirigido e mais um companheiro de criação. De alguma forma, naturalmente, fui passando para a direção. A idéia do projeto como um todo é o que me seduz, quando estou envolvido de verdade. Já estava de olho nas etapas do processo de um filme. Mas existiam coisas que eu não sabia de verdade que pudessem acontecer. Eu não imaginava o que era montar um filme. Não sabia o quão doloroso e importante era esse processo. A sensação que eu tenho é que o roteiro é primeiro um grande jorro. Um roteiro, uma poesia ou uma peça de teatro são febres internas. É preciso vomitá-las. Transformá-las em metáfora. E A Festa da Menina Morta veio assim.
E ao materializar essa febre, o que aconteceu? Matheus: Eu achei o processo da filmagem a parte mais encantadora de todas. É quando me sinto mais em casa. É a trupe viajando e fazendo a sua peça.
Você seguiu alguma regra? Matheus: Acho que dirigir é apontar um rumo e contaminar as pessoas. Contaminar os atores, os outros criadores. E fazer do filme o depoimento de cada uma dessas pessoas envolvidas. É preciso que eles estejam contaminados e em estado febril como você. Comprometê-los com a temática e os caminhos estéticos sugeridos. Contaminar com o seu vírus e ir seguindo delicadamente. Há diretores que trabalham agredindo, gostam das pessoas em estado de pressão e angústia. Pelo menos num primeiro filme, não me parecia que era cabível fazer isso. Quanto mais delicado eu fosse, mais eu teria a colaboração de todos.
Em Cannes, houve quem fizesse uma comparação do seu filme com os de Glauber Rocha. Houve alguma influência aí? Matheus: Apesar de ele ser um dos cineastas que admiro, não foi um parâmetro para mim. Foi uma surpresa. Aliás, quero pensar mais sobre isso: em quais aspectos a "Menina Morta" pode parecer com Glauber? Talvez em algo que o filme tenha de barroco. As pessoas precisam fortemente de um parâmetro de comparação. Não conseguem julgar uma obra isoladamente, precisam de referências. Então, falam de Herzog, de Glauber e, mais erroneamente, de Cláudio Assis. Procuram muito rapidamente encontrar uma família. Eu fico muito honrado com as comparações, achei bonito. Quem me dera que o filme tivesse parentesco com o Herzog, com o Glauber ou com Cláudio Assis. São grandes cineastas, mas eu não tenho essa necessidade de encontrar uma prateleira no supermercado da arte.
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